FERNANDO LIMOEIRO

Diretor, Autor, Professor e Mamulengueiro


"Sou de Pernanbuco, da cidade de Limoeiro e comecei fazendo teatro na escola, depois teatro de feira e movimentos populares. Sempre trabalhei com cultura popular e com o teatro como instrumento de conscientização política. Vim de uma formação, com forte influência de Pernambuco, do TPN (Teatro Popular do Nordeste), cujo mestre principal era o grande Emílio Borba Filho, com quem vi os primeiros grandes espetáculos, os Autos Populares e o teatro circense, que influenciam toda a minha obra ainda hoje. Ganhei uma bolsa de estudos de uma tia rica, e fui fazer um curso de teatro na Fundação das Artes São Caetano do Sul (FASCS). Daí, comecei a me interessar por dramaturgia. No segundo ano, escrevi um texto chamado "Desce Daí Peste", que foi montado pela turma formanda à frente da minha. Aí, a turma da EAD (Escola de Arte Dramática-SP) queria conhecer a FASCS, e acabaram montando textos meus: "Quem é Que Pode Com o Bode Quando o Bode Pode", "Pastoril Familial Abre Mais Que Agora Vai", "Meus e Eu", "Baião Para Um Cristo Nosso" e "Os Penitentes do Santo Cabrito", que agora adaptei para um musical, com o Incrível Rúcula, e vai se chamar "Deu Bode My God". Comecei a me dedicar à dramaturgia e direção, usando sempre os elementos regionais, voltados para o teatro popular. É bom não confundir popular, com popularesco. O humor de Pedro Malasartes, João Grilo e Chicó, com o humor da "Praça é Nossa". Nessa história de escrever, acabei voltando para o Nordeste depois de formado e fui trabalhar no Sesi, com teatro de operários, formando grupos com os quais trabalho até hoje. Há > > dez anos, tenho o Grupo Vale Arte, da Vale do Rio Doce, e outro em Santa Bárbara, que trabalha com montagens de Autos. Foi trabalhando nas fábricas que, em um dos centros dos Sesi, comecei com o mamulengo. Fui fazer uma oficina no Rio de Janeiro com o Grupo Giramundo e nesse curso, conheci a Madu (uma das fundadoras do Grupo, juntamente com o mestre Álvaro Apocalypse e Tereza), com quem me casei, vindo para Minas em 1981. Dei aula no Palácio das Artes, na Oficina de Teatro, e lá, fundei um grupo de mamulengo com Léo Ladeira, Wilma Rodrigues e uma porção de alunos. Fui me ocupando com a dramaturgia específica para teatro de bonecos. Entrei no TU em 1986, e sou professor de interpretação e improvisação até hoje. Espero que o TU mude a sua trajetória, mas seja sempre Teatro Universitário. Um lugar de gente séria, comprometida com a história e a qualidade técnica e ética na formação de seus atores. A diferença entre um ator formado em escola, para um formado na prática, está no sentido cultural, na disciplina, além de ele ser muito mais inquisidor e questionador do que um ator que não teve embasamento. É fácil observar os textos montados nas escolas ou por atores formados nelas. Buscam juntar a qualidade cultural da dramaturgia com a qualidade de interpretação. Poder fazer uma escola boa é um privilégio, mas fazer uma mal feita é um aleijão. Entre um ator que não tem formação e o que tem má formação, prefiro o primeiro, porque está sem vícios e aberto a propostas. A diferença do ator bem formado está na qualidade da informação. Existem duas frases que gosto de dizer: "teatro é trabalho, trabalho e depois aplauso". A outra é a frase com que ganhei o Prêmio Bonsucesso 2000 de melhor texto inédito infantil: "meu aluno não é minha sombra, meu aluno é minha luz".

PROJETOS - Farei um trabalho com a Wilma Rodrigues. O texto é meu e se chama "Sevé" ou "São Chico Daqui Mesmo", voltando a abordar a questão do mamulengo. Estou escrevendo também o texto "Por Baixo da Pele ou O Dia em Que Lampião Dançou Xaxado com Isadora Duncan", para a Andréia Garavello. Um projeto, que é > > a menina dos meus olhos, é o "Pólos Reprodutores de Cidadania". Um convênio do TU, Falculdade de Direito, PROEX e Prefeitura Municipal de BH. São frentes de trabalho: Frente de Luta Antimanicomial, de Vilas e Favelas e de População de Rua, que atuam com direitos humanos e cidadania, trazendo suas pesquisas para o "Grupo a Torto e a Direito", que as transformam em esquetes populares de rua. Vamos pelas favelas, associações, vilas e espaços alternativos, levando textos que conscientizem e provoquem reflexão, cujo tema atenda às necessidades daquelas comunidades. Outro projeto é o Vale Arte, com os operários da Vale do Rio Doce e os de Santa Bárbara, o "Âncora Grupo de Teatro". Trabalham com Autos da Paixão, em uma linguagem acessível, mas sempre estimulando a reflexão. Se um dia eu fosse me definir, diria que Fernando Limoeiro é um criativo e silencioso trabalhador teatral. Um operário do teatro.

O TEATRO - O teatro é polarizado em todos os lugares. Vai sempre existir aquele que faz um teatro voltado para o questionamento, qualidade técnica e cultural, e aquele que faz só pela diversão. "O teatro é para divertir educando e educar divertindo", como diz o Brecht. Na minha época de formação, já existia o problema de que o teatro ia morrer, não tem público, isso é novo ou velho. Faz parte da natureza do teatro, que é uma arte de resistência, de minorias, mas eterno. É cíclico. Fazíamos teatro como se fôssemos mudar o mundo. Aí, você vai vendo que não vai mudar o mundo coisa nenhuma, mas vai melhorar as pessoas e estimulá-las a querer mudá-lo. Não conheço outra forma de fazer teatro, e se ele não for um agente de modificação e um espelho histórico do seu tempo, não terá contribuição nenhuma para a humanidade. Torna-se uma casa de se passar o tempo. Acho que existem coisas muito melhores para passar o tempo do que ver teatro. Mas, o teatro mineiro está se aprimorando, se refinando e, muito em breve, não vai ter muito espaço para comédias rasas. Não sou contra a comédia, pelo contrário, adoro. Só acho que o Brasil está fazendo um humor pouco inventivo. Como já disse, meu riso é de João Grilo, que não iria à "Praça é Nossa". Espero que esse refinamento se produza nas salas de aula, para que depois a gente o assista nos palcos, no corpo, na voz e na inteligência dos nossos atores."

 

Coxia
Entrevista