Diretor, Autor, Professor
e Mamulengueiro
"Sou de Pernanbuco,
da cidade de Limoeiro e comecei fazendo teatro na escola, depois
teatro de feira e movimentos populares. Sempre trabalhei com cultura
popular e com o teatro como instrumento de conscientização política.
Vim de uma formação, com forte influência de Pernambuco, do TPN
(Teatro Popular do Nordeste), cujo mestre principal era o grande
Emílio Borba Filho, com quem vi os primeiros grandes espetáculos,
os Autos Populares e o teatro circense, que influenciam toda a
minha obra ainda hoje. Ganhei uma bolsa de estudos de uma tia
rica, e fui fazer um curso de teatro na Fundação das Artes São
Caetano do Sul (FASCS). Daí, comecei a me interessar por dramaturgia.
No segundo ano, escrevi um texto chamado "Desce Daí Peste", que
foi montado pela turma formanda à frente da minha. Aí, a turma
da EAD (Escola de Arte Dramática-SP) queria conhecer a FASCS,
e acabaram montando textos meus: "Quem é Que Pode Com o Bode Quando
o Bode Pode", "Pastoril Familial Abre Mais Que Agora Vai", "Meus
e Eu", "Baião Para Um Cristo Nosso" e "Os Penitentes do Santo
Cabrito", que agora adaptei para um musical, com o Incrível Rúcula,
e vai se chamar "Deu Bode My God". Comecei a me dedicar à dramaturgia
e direção, usando sempre os elementos regionais, voltados para
o teatro popular. É bom não confundir popular, com popularesco.
O humor de Pedro Malasartes, João Grilo e Chicó, com o humor da
"Praça é Nossa". Nessa história de escrever, acabei voltando para
o Nordeste depois de formado e fui trabalhar no Sesi, com teatro
de operários, formando grupos com os quais trabalho até hoje.
Há > > dez anos, tenho o Grupo Vale Arte, da Vale do Rio
Doce, e outro em Santa Bárbara, que trabalha com montagens de
Autos. Foi trabalhando nas fábricas que, em um dos centros dos
Sesi, comecei com o mamulengo. Fui fazer uma oficina no Rio de
Janeiro com o Grupo Giramundo e nesse curso, conheci a Madu (uma
das fundadoras do Grupo, juntamente com o mestre Álvaro Apocalypse
e Tereza), com quem me casei, vindo para Minas em 1981. Dei aula
no Palácio das Artes, na Oficina de Teatro, e lá, fundei um grupo
de mamulengo com Léo Ladeira, Wilma Rodrigues e uma porção de
alunos. Fui me ocupando com a dramaturgia específica para teatro
de bonecos. Entrei no TU em 1986, e sou professor de interpretação
e improvisação até hoje. Espero que o TU mude a sua trajetória,
mas seja sempre Teatro Universitário. Um lugar de gente séria,
comprometida com a história e a qualidade técnica e ética na formação
de seus atores. A diferença entre um ator formado em escola, para
um formado na prática, está no sentido cultural, na disciplina,
além de ele ser muito mais inquisidor e questionador do que um
ator que não teve embasamento. É fácil observar os textos montados
nas escolas ou por atores formados nelas. Buscam juntar a qualidade
cultural da dramaturgia com a qualidade de interpretação. Poder
fazer uma escola boa é um privilégio, mas fazer uma mal feita
é um aleijão. Entre um ator que não tem formação e o que tem má
formação, prefiro o primeiro, porque está sem vícios e aberto
a propostas. A diferença do ator bem formado está na qualidade
da informação. Existem duas frases que gosto de dizer: "teatro
é trabalho, trabalho e depois aplauso". A outra é a frase com
que ganhei o Prêmio Bonsucesso 2000 de melhor texto inédito infantil:
"meu aluno não é minha sombra, meu aluno é minha luz".
PROJETOS - Farei
um trabalho com a Wilma Rodrigues. O texto é meu e se chama "Sevé"
ou "São Chico Daqui Mesmo", voltando a abordar a questão do mamulengo.
Estou escrevendo também o texto "Por Baixo da Pele ou O Dia em
Que Lampião Dançou Xaxado com Isadora Duncan", para a Andréia
Garavello. Um projeto, que é > > a menina dos meus olhos,
é o "Pólos Reprodutores de Cidadania". Um convênio do TU, Falculdade
de Direito, PROEX e Prefeitura Municipal de BH. São frentes de
trabalho: Frente de Luta Antimanicomial, de Vilas e Favelas e
de População de Rua, que atuam com direitos humanos e cidadania,
trazendo suas pesquisas para o "Grupo a Torto e a Direito", que
as transformam em esquetes populares de rua. Vamos pelas favelas,
associações, vilas e espaços alternativos, levando textos que
conscientizem e provoquem reflexão, cujo tema atenda às necessidades
daquelas comunidades. Outro projeto é o Vale Arte, com os operários
da Vale do Rio Doce e os de Santa Bárbara, o "Âncora Grupo de
Teatro". Trabalham com Autos da Paixão, em uma linguagem acessível,
mas sempre estimulando a reflexão. Se um dia eu fosse me definir,
diria que Fernando Limoeiro é um criativo e silencioso trabalhador
teatral. Um operário do teatro.
O TEATRO - O
teatro é polarizado em todos os lugares. Vai sempre existir aquele
que faz um teatro voltado para o questionamento, qualidade técnica
e cultural, e aquele que faz só pela diversão. "O teatro é para
divertir educando e educar divertindo", como diz o Brecht. Na
minha época de formação, já existia o problema de que o teatro
ia morrer, não tem público, isso é novo ou velho. Faz parte da
natureza do teatro, que é uma arte de resistência, de minorias,
mas eterno. É cíclico. Fazíamos teatro como se fôssemos mudar
o mundo. Aí, você vai vendo que não vai mudar o mundo coisa nenhuma,
mas vai melhorar as pessoas e estimulá-las a querer mudá-lo. Não
conheço outra forma de fazer teatro, e se ele não for um agente
de modificação e um espelho histórico do seu tempo, não terá contribuição
nenhuma para a humanidade. Torna-se uma casa de se passar o tempo.
Acho que existem coisas muito melhores para passar o tempo do
que ver teatro. Mas, o teatro mineiro está se aprimorando, se
refinando e, muito em breve, não vai ter muito espaço para comédias
rasas. Não sou contra a comédia, pelo contrário, adoro. Só acho
que o Brasil está fazendo um humor pouco inventivo. Como já disse,
meu riso é de João Grilo, que não iria à "Praça é Nossa". Espero
que esse refinamento se produza nas salas de aula, para que depois
a gente o assista nos palcos, no corpo, na voz e na inteligência
dos nossos atores."
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