GLICÉRIO ROSÁRIO

Ator e Diretor


"A primeira peça que fiz foi em 1988, com a semente do que hoje é o Grupo Reviu a Volta, quando estava saindo do 2º grau em uma escola pública. Começamos a ensaiar na Lagoa do Nado todos os finais de semana, com cerca de 30 pessoas. Aí, foi-se selecionando e restaram umas 10. Tentamos montar alguns espetáculos, mas ainda não tínhamos uma estrutura muito firme. Em 91, depois de uma oficina bacana com o João das Neves, Rufo Herrera, Eládio Peres e Mônica Medeiros, aconteceu o espetáculo "Primeiras Histórias", com a direção do João das Neves. Isto fixou um pouco mais o Reviu a Volta, que até então só tinha feito de mais concreto um espetáculo de rua chamado "Risos e Guisos", no qual comecei a exercitar a direção. Com "Primeiras Histórias", que agregava também alguns grupos da região, o Grupo teve uma visibilidade muito grande, mas ainda era muito desorganizado. Em 92, a Cia. Sonho e Drama estava precisando de um ator para integrar o elenco do espetáculo "Caminho da Roça". Fui convidado e acabei ficando durante um bom tempo nos dois grupos, até que acabei entrando definitivamente para a Sonho e Drama. Atuava e era responsável pelo aquecimento corporal, já que tinha certa facilidade por já ter trabalhado dança antes de começar no teatro. Fiquei lá até 98, quando neste período, o Carlos Henrique, o Epaminondas Reis e eu fomos percebendo uma ligação muito grande entre nós dentro da Cia. Foi quando a gente achou mais interessante, tanto para nós quanto para a Sonho e Drama, sair e montar o Grupo Trama. Com a primeira montagem da Trama, a "Abracadalivro", pude novamente exercitar a direção. Montamos mais recentemente "O Homem da Cabeça de Papelão", com direção do Marcelo Bones e fiz também, em um projeto particular, um espetáculo infantil de mímica e música chamado "Bento, Cabeça de Vento", de minha autoria e direção. "O Inspetor Geral" é a minha direção mais recente. Foi com a turma de formandos do Teatro Universitário, com a qual tive uma experiência muito bacana.

TEATRO MINEIRO - Eu não sei como enxergo o teatro mineiro hoje. Acho que ele está quente, mas falta discussão estética e política, espaço para pesquisa e para mostrar esta pesquisa. Na Mostra que o MTG organizou em novembro, tentou-se puxar para esse lado. Com o advento das leis de incentivo parece que houve um "boom" de produção. Produz-se muita coisa hoje, o que pode ser um caminho interessante, desde que haja política para uma continuidade. Produz-se coisas boas, como também muitas ruins, passageiras, descartáveis e equivocadas. A Lei de Incentivo Municipal, na qualidade de Fundo, que é um dinheiro que vem direto da Prefeitura, não tem clareza sobre os rumos que estão tomando as montagens, quais discos estão sendo gravados e que livros estão sendo publicados. Em relação ao teatro, não se segue uma linha. O que se está priorizando em uma montagem? Está se querendo formar público? Até o conceito de projetos comunitários é confuso. Será que por ser artístico não pode ser comunitário? Até que ponto é comunitário ou experimental? Quando é um incentivo fiscal Municipal, Estadual ou Federal então, a coisa piora. Começa a ter esses atravessadores (empresas de captação) e os lobistas, ter empresa que não está interessada em aliar o seu nome a um espetáculo que, por exemplo, tenha um nu, seja ele artístico ou não. Então, falta política cultural. Esse "boom" é muito legal, mas tem esse lado que é um tiro pela culatra. Da mesma forma, vários eventos estão surgindo, o que me preocupa muito. Parece que o nosso público só vai ao teatro quando tem um evento grande, deixando as produções mais independentes à míngua. Mesmo em um teatro público é muito difícil manter uma temporada, sem se render a algumas coisas comerciais. A média de público é de aproximadamente 30 pessoas/dia e uma produção não se mantém com isso. Aí começam a surgir estas promoções (R$1,99, dízimo cultural, leve três e pague dois, adulto com duas crianças não paga), para tentar resgatar esse público que gosta de teatro, mas fica sempre esperando esses eventos. Daí surgem as críticas, dizendo que estas promoções depreciam o teatro. Mas tudo isso só vem como reflexo da tal falta de política cultural. Teatro agrada. O público belorizontino adora teatro e a gente sabe disso. É aí que eu aproveito para puxar a orelha da mídia e do poder público. A mídia é extremamente ingrata. Quando acontece algum espetáculo ligado a um evento que ela dá cobertura (e isso nem sempre acontece), fala que é muito bom. Mas quando esse mesmo espetáculo está em uma temporada regular, não tem espaço para divulgá-lo. Continuam tendo essa mentalidade extremamente provinciana de valorizar demais o que vem de fora. É aquela velha história: vai para fora e faz sucesso, volta e a mídia diz: é o nosso artista. O poder público é outro que está devendo. Está lavando as mãos com as leis. Nunca vi a Secretaria Municipal de Cultura tão largada. Desde que comecei a fazer teatro, em 88, vejo este como o pior momento. Fui professor do Arena da Cultura, um projeto fantástico que a Secretaria, desde o começo da atual gestão, não conseguiu reativar até hoje, como também não reativou o diálogo com os artistas. Acho que a Secretaria Municipal de Cultura, em especial, está deixando muito a desejar e não está cumprindo bem sua função.

TEATRO DE GRUPO - O que faz eu estar em um grupo de teatro e no Movimento de Teatro de Grupo é o fato de haver uma troca intensa de experiências. Há um escutar mais generoso das pessoas e a tentativa de uma relação mais bacana com toda a produção do espetáculo e direção. Os atores de grupo me parecem muito mais maduros e os enxergo com um discurso mais político. Grupos de teatro fazem bem para a cidade, porque reforçam a idéia de cidadania e coletividade. Estar em grupo é um exercício constante de coletividade e se o ator conseguir resolver as rixas que acontecem e que são até saudáveis, ele estará bem preparado para a sociedade como um todo. Outra vantagem é a possibilidade da continuidade de uma pesquisa estética e ideológica, culminando em um repertório. E isso, só com teatro de grupo. É como se fosse um arsenal. Os trabalhos mais interessantes que tenho visto em BH são de grupos. Grupo é o canal."

 

Coxia
Entrevista